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Sociofellows indicam para 2019, por Raúl Nunes

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gramsciGRAMSCI, Antonio. Cadernos do cárcere, volume 3. Edição de Carlos Nelson Coutinho, com a colaboração de Luiz Sérgio Henriques e Marco Aurélio Nogueira. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004.

Quem acompanha a conjuntura brasileira, entre choros e gargalhadas, já percebeu que o governo de extrema-direita tem um inimigo intelectual certeiro: Gramsci. Nas palavras do olavista que ocupa o Ministério da Educação, o “pensamento gramsciano” embasaria uma “onda globalista” responsável por destruir nossas instituições e nossos “valores culturais”. Olavo de Carvalho, o guru intelectual do governo, não raro menciona conceitos gramscianos aqui e acolá: hegemonia e intelectual orgânico talvez sejam seus preferidos. Em verdade, as análises de Olavo têm muito do “pensamento gramsciano”. Se até os conservadores nutrem tamanha fixação com o italiano, algo ele tem a nos dizer.

Antonio Gramsci foi um dos fundadores do Partido Comunista na Itália, tendo sido eleito deputado, até ser preso pelo regime fascista. Foi na prisão que escreveu os Cadernos do Cárcere, parte substantiva de sua obra. Um dos movimentos teóricos mais importantes do marxista foi ampliar a noção de política, incluindo a sociedade civil e a cultura. No volume 3 da edição brasileira dos Cadernos, o tema da política é central, começando pela discussão sobre Maquiavel e passando por reflexões sobre Estado, partidos e estratégia política.

hegemonia-e-estrategia-socialista-por-uma-politica-democratica-radicalLACLAU, Ernesto; MOUFFE, Chantal. Hegemonia e estratégia socialista: por uma política democrática radical. São Paulo: Intermeios, 2015.

Na década de 1980 um casal marxista resolveu atualizar Gramsci, com um pé no pós-estruturalismo e os olhos voltados aos movimentos sociais pós-1960 (os famosíssimos “novos” movimentos sociais). Laclau e Mouffe entendem hegemonia como a lógica recorrente e contingente da política, que envolve não só disputas de posições, mas sobretudo de imaginários – isto é, concebem a política como criação de mundos. É daí que os dois partem para pensar a democracia radical como uma convergência de diversas lutas, e não fruto da ação de um sujeito histórico universal.

Vale ler também seus trabalhos individuais. De Laclau, Sobre a razão populistaexplora a possibilidade de construção de um populismo de esquerda a partir de identidades múltiplas. De Mouffe, O regresso do políticoteoriza sobre os desafios e caminhos para a construção de articulação política entre os sujeitos, com especial atenção ao feminismo.

91fnjaz1k-lCASTELLS, Manuel. O poder da identidade (A era da informação: economia, sociedade e cultura. v.2). São Paulo: Paz e Terra, 1999.

 

Por fim, deixando Gramsci descansar em paz, a trilogia “A era da informação” é um prato cheio para quem quer compreender o presente. Nela, Castells faz uma diagnóstico das drásticas mudanças ocorridas na virada do milênio, sobretudo em três aspectos: tecnológico (A sociedade em rede), geopolítico (Fim do milênio) e identitário (O poder da identidade). Recomendo o volume sobre a identidade porque Castells conseguiu identificar, 20 anos atrás, alguns dos elementos mais críticos que nos trazem a essa conjuntura: globalização, flexibilização e crise da família patriarcal. Nas palavras do autor: “Quando o mundo se torna grande demais para ser controlado, os atores sociais passam a ter como objetivo fazê-lo retornar ao tamanho compatível com o que podem conceber. Quando as redes dissolvem o tempo e o espaço, as pessoas se agarram a espaços físicos, recorrendo à sua memória histórica. Quando o sustentáculo patriarcal da personalidade desmorona, as pessoas passam a reafirmar o valor transcendental da família e da comunidade como sendo a vontade de Deus” (Castells, 1999, p. 85).

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