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Parlamentares evangélicos e as discussões sobre os direitos da população LGBT, por Rafael Gonçalves

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Parlamentares evangélicos e as discussões sobre os direitos da população LGBT [1]

Rafael Bruno Gonçalves (Unipampa)[2]

Introdução

           É cada vez mais notório o envolvimento religioso na política institucional brasileira. Esta aproximação, como não poderia ser diferente, promove impactos no campo político, sobretudo no que concerne às discussões nos espaços públicos sobre os direitos humanos. Com o objetivo de reivindicar o lugar da religião no campo político, o avanço religioso alterou as relações em torno da laicidade do Estado e o caráter secularizante identificado nas discussões políticas nos seus diversos espaços, sejam elas originadas no Executivo, no Legislativo ou no Judiciário. Os religiosos buscam, através da participação no espaço público, ampliar a influência em torno das discussões que mencionam valores que também são discutidos no âmago das instituições religiosas. Em algumas circunstâncias, esta influência gera conflitos, principalmente quando os preceitos religiosos dividem opiniões como nos momentos em que são mencionados discursos contrários aos direitos da população LGBT.   

           O presente artigo pretende identificar os discursos de parlamentares evangélicos, a partir do momento da fundação da Frente Parlamentar Evangélica, em 2003, tendo como objeto de análise a tramitação do Projeto de Lei Nº 5.003 de 2001, que mais tarde seria alterado para Projeto de Lei da Câmara Nº 122, de 2006, verificando as construções discursivas sobre o tema, procurando compreender os debates travados no campo político e religioso sobre o tema da homossexualidade, tendo como ponto de referência os posicionamentos de parlamentares no Congresso Nacional e outros segmentos que manifestam suas posições favoráveis e contrárias sobre o PLC 122/2006.

           O objetivo deste artigo é realizar uma análise das estratégias aplicadas por parlamentares evangélicos no momento em que estes procuram impedir avanços do movimento LGBT, verificando como se dá a influência deste lobby sobre as decisões do poder público. Para tanto, será empregada uma tentativa de análise discursiva, apoiada nas contribuições de autores que trabalham com esta abordagem. O tema deste texto justifica-se pela importância de se realizar investigações mais profundas no campo do legislativo brasileiro sobre a atuação de religiosos na esfera parlamentar, tendo como aporte os conceitos desenvolvidos por autores que trabalham com a análise do discurso.

O Projeto de Lei da Câmara Nº 122, de 2006

           Originalmente, o Projeto nº 5.003/2001[3], de autoria da Deputada Iara Bernardi (PT-SP), começou a tramitar na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados em agosto de 2001. Após cinco anos de tramitação, o projeto foi aprovado no Plenário da Câmara e encaminhado para o Senado, passando a constituir o Projeto de Lei da Câmara nº 122 de 2006. O Projeto de Lei visava alterar, entre outros pontos, a Lei Federal nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, também conhecida como Lei do Racismo, criminalizando a discriminação ou preconceito de cor, gênero, sexo e orientação sexual. A lei passaria a vigorar com a seguinte redação: “Art. 1º Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião, procedência nacional, gênero, sexo, orientação sexual e identidade de gênero”. (PLC nº122/2006, p. 02)

           O PLC 122/2006 passou por diversas mudanças ao longo dos anos em que tramitou no Congresso Nacional. Além da inclusão da criminalização da homofobia em todos os artigos da Lei nº 7.716 de 1989, o mesmo projeto “(…) inclui esta discriminação / violência no artigo do Código Penal que versa sobre a Injúria Racial, como também em um artigo da Consolidação das Leis do Trabalho que trata sobre a discriminação sexual no trabalho” (VITAL DA CUNHA; LOPES, 2012, p.130). O objetivo seria inserir a questão do preconceito sobre a orientação sexual e gênero nas leis que mencionavam a criminalização do racismo.  No Senado, o PLC 122/2006 já passou pelas Comissões de Assuntos Sociais, sendo aprovado nessas instâncias. Foi realizada uma audiência pública no Senado Federal em 2007 para discutir a matéria, uma vez que a audiência foi convocada pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa com o propósito de “aprofundar o debate em torno do PLC 122/2006”, relativo à criminalização da homofobia. O intuito era discutir as “conquistas” deste segmento a partir das discussões sobre o Estado laico e “construir uma agenda visando à aprovação de projetos de leis de interesse de cidadãos e cidadãs GLBT” (NATIVIDADE; LOPES, 2009).

           O momento era de intensos debates sobre a garantia de direitos à população LGBT, associada ao combate à homofobia. Seminários eram realizados pelas organizações LGBT nas dependências do Congresso Nacional contando com a presença de lideranças de diversas regiões do país, junto com professores, pesquisadores do assunto e jornalistas, espaço onde “(…) diversos parlamentares, senadores e deputados, assim como líderes de movimentos sociais, discursavam sobre a importância de se “conter” valores não-laicos nas ações governamentais” (NATIVIDADE; LOPES, 2009, p. 75).

           A mobilização em torno do PLC 122, desempenhada por parlamentares e lideranças do público LGBT, trouxe uma maior visibilidade sobre um assunto que ainda era tratado de forma secundária dentro da Câmara dos Deputados. Foi somente com a tramitação deste projeto, que foram realizadas as discussões que tratavam do combate à violência e à discriminação contra os homossexuais. O projeto conseguiu canalizar opiniões que não interessavam somente ao público LGBT, mas também àqueles que mantinham um posicionamento favorável à luta contra a homofobia, um projeto que tinha a responsabilidade de somar todos os anseios, as demandas daqueles que somavam forças no combate à discriminação sofrida não apenas pelos homossexuais, mas pelos negros, índios, mulheres e aqueles provenientes de outras nacionalidades, enquadrando como crime qualquer atitude resultante de discriminação ou preconceito.

           Os debates gerados em torno do PLC 122 demonstram que as aspirações do segmento LGBT começaram a garantir maior visibilidade nos espaços legislativos. Diversos projetos de lei começaram a ser apresentados nos últimos anos, contudo, desde o início do processo de redemocratização, qualquer iniciativa que objetivasse a ampliação dos direitos das minorias sexuais no país, sofria forte resistência, principalmente de grupos religiosos, através de uma atuação que buscava pressionar os legisladores na criação de empecilhos legais.

           Deve-se destacar que a mobilização gerada pela Frente Parlamentar Evangélica sobre o PLC 122, foi a maior barreira encontrada pelos movimentos LGBT na agenda política contemporânea. No Brasil, as diferentes ações que são tomadas pela sociedade civil organizada, e também pelos governos, sobre o assunto, refletem a crescente preocupação com a garantia dos direitos e com a necessária expansão destes direitos de cidadania aos homossexuais (MACHADO, 2010). É neste sentido que o PLC 122 apresenta na sua justificativa o recurso à expansão da cidadania para o segmento LGBT no Brasil:

A orientação sexual é direito personalíssimo, atributo inerente e inegável à pessoa humana. E como direito fundamental, surge o prolongamento dos direitos da personalidade, como direitos imprescindíveis para a construção de uma sociedade que se quer livre, justa e igualitária. Não se trata aqui de defender o que é certo ou errado. Trata-se de respeitar as diferenças e assegurar a todos o direito de cidadania (PROJETO DE LEI DA CÂMARA nº 122 DE 2006, p.8-9).

               Ainda na justificativa, o projeto menciona a responsabilidade dos parlamentares em assegurar direitos, que independam das escolhas e valores individuais, tudo isso associado à necessidade de “(…) discutir e assegurar direitos humanos sem hierarquizá-los. Homens, mulheres, portadores de deficiência, homossexuais, negros/negras, crianças e adolescentes são sujeitos sociais, portanto sujeitos de direitos” (Idem).  

           De acordo com o levantamento realizado pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes, citado no relatório da Comissão de Assuntos Sociais de 2009, as ações legislativas relativas à homossexualidade conseguiram importantes avanços:

As muitas iniciativas legislativas, de justiça e da extensão de direitos, nas grandes cidades e municípios médios, principalmente na criminalização do preconceito homofóbico e na garantia de direitos de pensão e outros benefícios previdenciários a cônjuges homossexuais. No Legislativo Federal, destaca-se emblematicamente a proposta de Parceria Civil Registrada, apresentada em 1996, pela então deputada Marta Suplicy; e a criação, em outubro de 2003, da Frente Parlamentar Mista pela Livre Expressão Sexual que, a partir de 2007, passou a chamar-se Frente Parlamentar pela Cidadania GLBT e conta com 216 membros. A criação dessa frente institucionalizou os direitos sexuais como temática relevante no Congresso Nacional e altera a correlação de forças em disputa na conformação desses direitos. (RELATÓRIO DA COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS, 2009, p.09)

           A expansão dos direitos para a população LGBT promovida pelo PLC 122 colocava em debate na esfera pública os diferentes posicionamentos sobre a orientação sexual das pessoas, e os diferentes sujeitos que estavam envolvidos no combate à homofobia, atuando na defesa dos direitos humanos, conduzindo para o campo legislativo os argumentos favoráveis à aprovação do projeto, resultados dos longos debates que eram promovidos pelas associações que discutiam o combate à homofobia e à discriminação por orientação sexual.

           Durante a sua tramitação no Congresso, foi construído em torno do PLC 122 um Grupo de Trabalho que contava com membros da Comissão dos Direitos Humanos, parlamentares, representantes do Ministério Público e de órgãos do Executivo, representantes de organizações da sociedade civil, além de cidadãos e cidadãs que realizavam os seus trabalhos de forma voluntária, apresentando suas sugestões quanto ao conteúdo do projeto que estava sobre exame.

           A relatora do PLC 122, senadora Fátima Cleide, em novembro de 2009, defendeu que o projeto, na forma de Substitutivo, seria caracterizado como um importante instrumento no combate às manifestações homofóbicas e também na garantia de cidadania para os grupos que diariamente têm os seus direitos violados.  A última ação relacionada ao projeto, de 17 de dezembro de 2013, foi a aprovação do Requerimento nº 1443, de autoria do Senador Eduardo Lopes[4] (PRB-RJ), que solicita a anexação do PLC 122 ao Projeto de Lei do Senado nº 236, de 2012, denominada Reforma do Código Penal Brasileiro. O projeto será levado à Comissão Temporária de reforma do Código Penal, para ser anexado ao Projeto de Lei do Senado nº 236, de 2012. Atualmente, a matéria encontra-se com a relatoria na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

Os embates discursivos em torno do PLC 122/2006

           Um dos trabalhos realizados pela FPE, através do Grupo de Assessoria aos Parlamentares Evangélicos (GAPE), é o acompanhamento de propostas realizadas pelo governo e a tramitação de projetos de lei. Boa parte destes projetos desperta a atenção dos evangélicos pelo seu conteúdo. Trata-se de temas que muitas vezes são discutidos no próprio âmbito confessional como, por exemplo, o aborto, a homossexualidade, a prostituição e o consumo de drogas.  Entre outros assuntos, os discursos sobre estes temas na Câmara recebem dois vocabulários diferentes, um com características laicas e outro com características religiosas. Essas duas concepções, ou formas de tratar o mesmo tema, acabam entrando em conflito ou, dependendo das circunstâncias, se entrecruzam. Este quadro reforça a ideia de que é preciso levar em consideração, cada vez mais, nas análises sobre o que é propriamente discutido na política, as variadas formas discursivas e os atores que estão por trás dessas manifestações retóricas, chegando assim

 (…) a um patamar de ampliação da compreensão e da prática sobre o que está em jogo na política: mais do que interesses pré-constituídos fora dela, e nela apenas representados, também identidades e construções culturais do mundo a partir de perspectivas particulares (BURITY, 2011, p.126).

 

           São essas construções culturais fundamentadas nas justificativas confessionais, identificadas nas falas dos parlamentares evangélicos sobre o PLC 122/2006, que entram em conflito com as argumentações de caráter secular, daqueles defensores do projeto que trata da criminalização da homofobia. O cenário de análise explorado nesta pesquisa exige a atenção sobre as relações entre Estado e religião, visto que é cada vez mais presente esta atitude dos atores políticos religiosos, ou seja, de ressignificação do político, de pluralidade de práticas, de um maior envolvimento do segmento evangélico sobre as questões públicas, na tentativa de influenciar as políticas públicas, uma atuação que, de acordo com os próprios fundamentos da FPE, busca “defender a família e a sociedade, no respeito aos bons costumes e à moralidade”. (REVISTA DA FRENTE PARLAMENTAR EVANGÉLICA, 2004, p.06). Entende-se por “bons costumes” o conjunto de valores e regras de conduta, e de práticas de vida situadas nas relações sociais e familiares, que são aceitas por um determinado grupo, neste caso o religioso, e que compõem aquilo que é considerado correto, honesto, evitando relações que afetem os bons costumes ou a violação das normas preestabelecidas, interferindo na harmonia social. A “moralidade” está representada nas práticas comuns no segmento religioso, onde cada adepto apresenta as mesmas qualidades e códigos de conduta. As normas que são estabelecidas pela moral são capazes de regular a ação dos indivíduos, estabelecendo critérios onde cada um poderá distinguir o que é bom e o que é ruim.

         O propósito deste artigo é entender os conflitos em torno do PLC 122, a partir da análise discursiva, percorrendo desde os primórdios da tramitação do projeto na Câmara, as diferentes caracterizações que o mesmo recebeu por parte de parlamentares contrários, sobretudo os evangélicos e os favoráveis. A seguir será realizada a aplicação de alguns elementos teóricos já apresentados neste texto sobre a teoria da análise do discurso, com o propósito de evidenciar os diferentes lugares do discurso, ou campos discursivos; e que contribuem para identificar as múltiplas características que os enunciados proferidos no púlpito da igreja ou no plenário da Câmara passam a adquirir.

Deputados evangélicos e o discurso sobre o PLC 122/2006

           Para esta pesquisa, foram coletados todos os pronunciamentos provenientes de parlamentares evangélicos e não evangélicos que mencionam o PLC 122/2006, assim como outros pronunciamentos que tinham como característica o enfoque sobre assuntos relativos à homofobia, homossexualidade e orientação sexual. Estes passaram a constituir as palavras-chave para a coleta dos discursos durante as sessões ordinárias da Câmara dos Deputados, focando nas seguintes fases: Pequeno Expediente (PE), Grande Expediente (GE), Ordem do Dia (OD), Breves Comunicações (BC) e Comunicações Parlamentares (CP). Seguindo as contribuições de Ricoeur (1990), pretende se realizar a interpretação discursiva na linguagem, preferencialmente a linguagem escrita aqui apresentada e exposta nos pronunciamentos identificados nas notas taquigráficas. Contudo, deve-se entender que os textos representam unidades complexas, que são heterogêneos tanto quanto à natureza dos diferentes materiais simbólicos, quanto à natureza das linguagens e às posições do sujeito (ORLANDI, 2013).

O ano que apresentou o maior número de pronunciamentos provenientes de deputados evangélicos sobre esta temática foi 2013, conforme demonstra a tabela a seguir:

Tabela 1 – Pronunciamentos sobre o tema PLC 122/2006, homossexualidade e orientação sexual (2003 – 2014*)

Ano

Pronunciamentos

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

2014

 6

 1

 4

 5

 4

 2

 0

 2

 21

 6

 30

 1

Total

     82

*Até 11/04/2014

  Fonte: CÂMARA DOS DEPUTADOS.

           O período que remete ao recorte de análise é o que compreende o momento da fundação da FPE, ou seja, a partir de 2003, até abril de 2014[5]. Devido à importância que o tema ganhou em outros momentos regimentais, optou-se por realizar a coleta não apenas nas sessões do Grande Expediente, período em que o parlamentar dispõe de mais tempo no plenário para realizar o seu pronunciamento, mas também durante as outras fases nas sessões ordinárias no período supracitado.

           O pronunciamento do deputado federal Milton Cardias (PTB-RS) realizado em julho de 2003 durante o Grande Expediente, foi o primeiro que manifestou preocupação com a temática que será objeto de análise desde a fundação da Frente. No seu pronunciamento, Cardias enquadra a homossexualidade como crime, defende o que considera “bons costumes”, baseando sempre a sua argumentação em preceitos bíblicos, conforme demonstra o excerto a seguir: 

Então, convenhamos, Sr. Presidente e nobres Parlamentares: se a conjunção carnal entre pessoas do mesmo sexo não é ofensiva aos bons costumes, que mais o será? A gravidade do homossexualismo ultrapassa a do adultério, que é tipificado como crime no art. 240 do Código Penal. (…) Os defensores do homossexualismo alegam que o Brasil é um Estado laico, em que os argumentos religiosos seriam irrelevantes. É fácil provar a falsidade de tal afirmação.(…) Assim sendo, a existência de Deus e o respeito a Ele devem nortear a interpretação de toda a ordem constitucional, donde se conclui que a religião (o liame entre o homem e Deus) tem relevância em nosso direito e os argumentos religiosos não podem ser desprezados como impertinentes.(…) Quero, Sr. Presidente, deixar registrado o meu clamor, como brasileiro, como Parlamentar ou como Pastor da Assembléia de Deus, para que sejam preservados os nossos bons costumes e para que não haja mais nesta Casa, mesmo entendendo ser esta o emblema maior da democracia, nenhum tipo de glorificação a opções sexuais. Dep. Milton Cardias, PTB – RS (Diário da Câmara dos Deputados, 01/07/2003, Sessão: 001.1.52.E / GE)

           Cardias defende no seu pronunciamento que o que está acontecendo é uma “glorificação do homossexualismo”, o que, segundo o deputado, deve ser impedido, pois o “homossexualismo” fere os “bons costumes” da família. Percebe-se que a utilização do termo “homossexualismo”[6] em vez de homossexualidade é ainda muito comum nos discursos evangélicos, pois tratam esta como doença ou desconhecem a mudança do termo.

           O deputado assume a sua orientação religiosa durante o pronunciamento exaltando o cargo que ocupa na Igreja Assembleia de Deus e também através do conteúdo explicitamente confessional, baseado em argumentos religiosos para justificar o seu posicionamento sobre questões relativas à opção sexual. Deve-se destacar que a maioria dos pronunciamentos sobre esta temática durante o período investigado é proveniente de parlamentares membros da Assembleia de Deus, como demonstra a tabela a seguir:

Tabela 2 – Pronunciamentos de deputados evangélicos sobre homossexualidade, orientação  sexual e o PLC 122 por denominação religiosa (2003 – 2014*)

Igreja

Número de pronunciamentos
Assembleia de Deus

Metodista

Presbiteriana

Igreja do Evangelho Quadrangular

Batista

Igreja Universal

Igreja Brasil Para Cristo

Igreja Renascer

Igreja Internacional da Graça de Deus

Igreja Sara Nossa Terra

43

6

7

6

9

5

3

1

1

1

Total

    82

*Até 11/04/2014                  

Fonte: CÂMARA DOS DEPUTADOS.

           Desde a fundação da FPE em 2003, a Assembleia de Deus tem-se constituído como a maior força parlamentar dentro da organização. Boa parte dos pronunciamentos de deputados que assumem a vinculação com a Assembleia de Deus, exaltam a orientação religiosa, seguido de justificativas bíblicas diante dos temas que emergem e, neste caso, que mencionam a questão da homossexualidade, como demonstram os pronunciamentos a seguir:

A existência de homens e mulheres não constitui, pois, simples coincidência, obra do acaso. Feitos à imagem e semelhança do Criador, somos personagens de um plano divino, pessoas destinadas a ser marido e mulher para constituir família e preservar a espécie. Deus não criou um terceiro sexo. (…) como poderíamos considerar coerente e oportuno o ato realizado, no salão nobre do Congresso Nacional, no último dia 8, para o lançamento da Frente Parlamentar pela Livre Expressão Sexual? Conforme notícia veiculada pela Agência Câmara, um dos objetivos da Frente Parlamentar pela Livre Expressão Sexual é articular a aprovação de proposições legislativas de interesse da comunidade de gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais brasileiros. (…) tal procedimento é contrário a tudo o que sempre difundi, por isso terá o meu mais veemente e constante repúdio. Mais ainda, posso afirmar, com absoluta certeza, que é contrário ao que pensa a grande maioria da população brasileira, consciente da necessidade de preservar a família e os valores cristãos. E, saliente-se, essa não é uma posição exclusiva da Assembléia de Deus, da qual tenho a graça de ser presbítero; é convicção de todos os que seguem os preceitos da cristandade. Dep. Antonio Cruz, PTB – MS (Diário da Câmara dos Deputados, 05/11/2003, Sessão: 252.1.52.O / GE)

         Deixo registrada minha revolta e indignação com o famigerado Programa Brasil sem Homofobia. Trata-se de verdadeiro acinte à moral e aos bons costumes. (…) dezenas de entidades que apóiam a pederastia, a sodomia, a ignomínia e a insensatez e outras dezenas de gays, lésbicas, transgêneros, bissexuais e afins.  Meu Deus, onde chegamos! Esqueceram essas autoridades os ensinamentos de Nosso Senhor Jesus Cristo, a palavra de Deus, a moral e os bons costumes? (…) Na minha opinião essas pessoas, mulheres e homens públicos, que deveriam estar cuidando do bem-estar e dos interesses maiores das famílias brasileiras, jamais leram a Bíblia. Nela, de forma cristalina, como a mais pura água, está literalmente escrito que “com homem não te deitarás como se fosse mulher. É abominação”. (…) Não é direito de nenhum ser humano decente e temeroso a Deus propositadamente praticar ações que visam à destruição da família, a base de toda a sociedade sadia e progressista. A meu ver – e digo isso em nome da imensa e esmagadora maioria dos brasileiros -, nosso papel social deve, antes de quaisquer outros princípios, ser regido pelos mandamentos divinos. Dep. Pastor Frankembergen, PTB – RO (Diário da Câmara dos Deputados, 09/09/2004, Sessão: 185.2.52.O / GE)

           No primeiro pronunciamento, proveniente do deputado federal Antonio Cruz (PTB-MS), membro da Igreja Assembleia de Deus, constata-se a retórica de cunho religioso que pretende desqualificar o ato de lançamento da Frente Parlamentar pela Livre Expressão Sexual, associado a um discurso de defesa da família, o que constituirá um ponto nodal[7] em quase todos os pronunciamentos sobre o assunto.  O segundo excerto, do deputado Pastor Frankembergen (PTB-RO), realiza uma crítica ao Programa Brasil sem Homofobia[8], argumentando que esta iniciativa estaria afrontando a “moral” e os “bons costumes”.

         Ambos os pronunciamentos buscam sustentar-se em argumentos bíblicos para justificar o posicionamento contrário às reivindicações do segmento LGBT. O discurso evangélico procura apoio em citações da Bíblia para dar ênfase a uma suposta verdade, demonstrando assim a utilização de um conjunto de textos ligados por relações intertextuais (MAINGUENEAU, 1998). Isso representa uma estratégia que evidencia a recorrência do interdiscurso, pois este é um discurso novo apoiado em um discurso antigo, ou seja, o bíblico. O posicionamento evangélico sobre o PLC 122 demonstra que é possível haver essa intertextualidade, a menção de argumentos da Bíblia, até mesmo nos espaços laicos de atuação. Basta apenas para o sujeito que emite o discurso o reconhecimento de que o sujeito ouvinte irá captar o sentido contido no seu enunciado.

           Também é possível verificar nesses trechos que os evangélicos se assumem como porta-vozes de uma maioria que, na concepção destes, é contrária às iniciativas promovidas na defesa dos interesses dos homossexuais, visto o recorrente uso de argumentos como: ser “(…) contrário ao que pensa a grande maioria da população brasileira (Dep. Antonio Cruz, PTB – MS)”, “(…) digo isso em nome da imensa e esmagadora maioria dos brasileiros (Dep. Pastor Frankembergen, PTB – RO).” O recurso utilizado por esses parlamentares, de apelar ao que eles consideram ser a posição da “maioria do povo”, pode ser caracterizado neste contexto específico de construção dos enunciados como uma forma de discurso indireto, pois essa maioria representaria a opinião do outro que está oculto.

        Outro ponto, que deve ser destacado sobre os discursos coletados, é relativo ao constante uso do relato bíblico de Sodoma e Gomorra[9]. A utilização recorrente desta passagem pelos deputados evangélicos está relacionada ao que eles consideram como a primeira referência ao assunto citado na Bíblia. Para os evangélicos, tal passagem serve como elemento central na argumentação contrária às demandas do segmento LGBT. Trata-se de um exemplo de discurso constituinte cristão, pois almeja fundar outros discursos, instituindo um elo com uma Revelação. Todo discurso constituinte é “tomado numa relação conflituosa com os outros e mobiliza comunidades discursivas específicas” (MAINGUENEAU, 1998, p.32). Os excertos abaixo relacionados demonstram as condições de emergência do discurso sobre Sodoma e Gomorra:

A primeira referência ao homossexualismo está no livro de Gênesis, quando os habitantes das cidades de Sodoma e Gomorra tentaram violentar sexualmente 2 anjos com aparência humana. Assim, a Bíblia menciona, em Gênesis 19, a exigência dos homens da cidade que tentavam invadir a casa de Ló, onde os anjos se hospedaram: “Onde estão os homens que, à noitinha, entraram em tua casa? Traze-os fora a nós para que abusemos deles”. Dep.Milton Cardias, PTB – RS (Diário da Câmara dos Deputados, 28/10/2003, Sessão: 241.1.52.O / PE)

        Deputados, o homossexualismo é a droga não combatida que assola a sociedade moderna e a desvirtua dos princípios divinos. No passado, apesar de misericordioso e bondoso, Deus teve de destruir Sodoma e Gomorra por não suportar tais práticas – isso está na Bíblia. A sociedade brasileira, independentemente do credo religioso, precisa preocupar-se, porque o castigo de Deus não caiu apenas sobre os gays de Sodoma e Gomorra, mas sobre todos os habitantes daquelas cidades. Dep. Zequinha Marinho, PSC – PA (Diário da Câmara dos Deputados, 30/05/2005, Sessão: 109.3.52.O / PE)

        O que defensores liberais querem é que os conceitos familiares não fiquem presos somente na conjugação de homens e mulheres. Querem uma nova ordem. Essa ordem pode permitir que casais homossexuais se enquadrem em uma nova estrutura familiar – parece-me tendenciosa ao caos, Sr. Presidente. A Bíblia cita o caso das cidades de Sodoma e Gomorra, bom exemplo de que no passado essa falsa liberdade não foi boa para a sua estrutura familiar. Dep. Pastor Eurico, PSB – PE (Diário da Câmara dos Deputados, 20/04/2011, Sessão: 080.1.54.O / CP)

        Os pronunciamentos que utilizam como recurso o relato bíblico de Sodoma e Gomorra devem ser pensados como gêneros discursivos, pois eles possuem a capacidade de unir e dinamizar a relação entre pessoas, ou sistemas de linguagem, provenientes de diferentes espaços e não apenas entre o interlocutor e o receptor. Por exemplo, o público de fiéis de uma determinada igreja e os parlamentares que pertencem ao mesmo segmento religioso, ambos utilizam a mesma justificativa religiosa para manter a contrariedade sobre o PLC 122, porém, em ambientes diferentes.

        Cabe aqui explorar as justificativas que são mencionadas em diferentes espaços para compreender a dinâmica discursiva e a ação, quando são mobilizados elementos provenientes de outras áreas para fundamentar a atuação legislativa contrária ao Projeto de Lei 122. Como os três pronunciamentos acima são provenientes de parlamentares que pertencem à Igreja Assembleia de Deus, neste momento serão priorizados os argumentos utilizados nos meios de comunicação desta denominação sobre o assunto.

        A Assembleia de Deus Vitória em Cristo, que tem como principal expoente o pastor Silas Malafaia, coordenador e apresentador do programa televisivo Vitória em Cristo, publicou em 2013 na Revista Aliança, periódico da mesma denominação, uma matéria que relatava a manifestação de milhares de evangélicos em Brasília, em junho do mesmo ano, ocasião em que expressavam a contrariedade em torno de temas como a união homoafetiva e o aborto, ao mesmo tempo em que realizaram a defesa da liberdade de expressão e os valores tradicionais da família.  Sobre a menção do PLC 122 pelo pastor Silas Malafaia durante o evento, a revista realiza o seguinte comentário:

Incansável na defesa da livre manifestação do pensamento, pastor Silas Malafaia reiterou seu discurso, afirmando que a Constituição garante a liberdade de opinião. “O Brasil é um estado democrático de direito e ninguém vai ter que rasgar a Constituição do Brasil”, enfatizou o líder evangélico a respeito do Projeto de Lei 122, que está em tramitação no Congresso, e que criminaliza quem crítica a conduta homossexual. “Minoria não pode calar minoria. O direito de um grupo social não pode cercear o dos outros. Eu não quero privilégio para os evangélicos, mas também não aceito privilégio para gay”, afirmou o pastor acerca da chamada “Lei da Homofobia” (REVISTA ALIANÇA, 2013, n°16, p.15).

           O discurso do pastor Silas Malafaia se constitui diante daquilo que representa uma ameaça, ou seja, a prioridade que os homossexuais almejam com a nova lei, que na caracterização dos evangélicos, iria contra o que estava previsto na Constituição, como a garantia da liberdade de opinião. Trata-se de um discurso apoiado em preceitos jurídicos, sustentado em argumentos que consideram o segmento religioso como grupo que também é perseguido, como minoria. O discurso de Malafaia não difere daqueles identificados no plenário. A construção discursiva está relacionada a um sentido legal, ou seja, ela está representada dentro de uma lógica carregada de aspectos jurídicos que pretende assegurar o respeito aos direitos adquiridos pelos evangélicos no estado democrático, principalmente a garantia da liberdade de expressão. Além do sentido assumido pelo discurso neste espaço, é importante levar em consideração a posição do sujeito enunciador durante o ato da fala. O discurso adquire legitimidade pela capacidade que Malafaia tem de mobilizar, ao seu favor, uma série de elementos provenientes de diversos âmbitos, por exemplo, o político, o jurídico e o religioso. Por ser uma liderança evangélica capaz de estimular a confiança do fiéis, e por adquirir um papel respeitado inclusive pelos parlamentares religiosos, Malafaia assume a posição de porta-voz de uma minoria, que também é perseguida na visão deste, e que está situada dentro de uma lógica agônica, pois ambos são adversários, movimento LGBT e evangélicos, em um movimento capaz de produzir identidades coletivas ao redor de posições diferentes, onde se constituem apenas duas possibilidades de escolha para os cidadãos (MOUFFE, 1999), o direito, ou a ausência de direitos para os evangélicos ou o direito dos homossexuais.   

           Ainda sobre os discursos nos meios de comunicação evangélicos sobre o tema, conforme a tabela a seguir, foram divulgadas no portal de notícias da Casa Publicadora das Assembleias de Deus, CPAD News, as seguintes matérias sobre a tramitação do PLC 122 na Câmara e no Senado:

Tabela 3 – Matérias publicadas sobre o PLC 122/2006 no portal de notícias da Assembleia de Deus

Título Data Fragmento da notícia
PT ameaça processar pastor Piragine por vídeo que faz alerta sobre as eleições 10/09/2010 No dia 29 de agosto o pastor alertou a Igreja sobre a ‘iniquidade estatizada’ e denunciou que o PT, durante o Congresso anual, manifestou-se favorável ao aborto, PLC 122/06. A mensagem repetida durante os dois cultos da Igreja lembrou como a iniquidade pode ferir o coração do homem. Após pedir oração pelas eleições, exibiu um vídeo mostrando os casos de abortos, infanticídios indígenas e ameaça à igreja através do PLC 122/06 que cria uma ditadura gay.
Relatora do PLC 122/06 não se reelege ao Senado 05/10/2010 Mesmo com a intensa campanha feita pelos principais líderes do movimento homossexual, a senadora Fátima Cleide (PT-RO), relatora do PLC 122/06, não se reelegeu ao Senado. Ela só conquistou 16,05% dos votos, a metade do segundo colocado.
O desarquivar do PLC contra a homofobia. Marta Suplicy quer ser a nova relatora 21/01/2011 Segundo informações contidas em seu Twitter, a senadora Marta Suplicy está em contínua e discreta mobilização para que o Projeto de Lei da Câmara 122, sobre a criminalização da homofobia, saia do arquivamento.
Marta Suplicy consegue as 27 assinaturas. Vice-presidente do Senado consegue apoio para desarquivar PLC 122 05/02/2011 O primeiro ato da Senadora Marta Suplicy no Senado foi conseguir as 27 assinaturas necessárias para desengavetar o PLC 122, projeto de lei que quando aprovado tornará crime OPINIÕES e atos “homofóbicos” e discriminatórios contra homossexuais no Brasil. 
Campanha contra casamento gay no Twitter. Campanha ganha força no contexto dos recentes avanços dos projetos contra homofobia 12/03/2011 A questão da homofobia vem provocando a ira dos cristãos, principalmente com o recente desarquivamento do projeto de lei PLC 122/06 pela senadora Marta Suplicy prevendo uma alteração da Lei nº 7.716, para criminalizar a homofobia.
Marta Suplicy altera PL 122 para ludibriar cristãos. Novo parágrafo restringe liberdade de expressão de cristãos só para dentro de seus templos 08/04/2011 A alteração consiste na inserção de um parágrafo que restringe a liberdade de se manifestar contra a prática homossexual apenas aos templos religiosos. Segundo o novo texto, a lei não se aplicará a pregações em templos religiosos, “desde que não incitem a violência”.
Senado vota PL 122 nesta quinta-feira, 12 de maio. Ativistas gays aproveitam da decisão do STF para pressionar criminalização da chamada ´homofobia´ 11/05/2011 A Comissão de Direitos Humanos (CDH) deve votar nesta quinta-feira (12) o substitutivo que a senadora Marta Suplicy (PT-SP) fez no PLC 122, projeto que tem como objetivo criminalizar toda opinião filosófica, médica, moral e religiosa contrária à relação sexual entre pessoas do mesmo sexo.
Senadora tenta trazer de volta votação da PL 122. Após adiamento da votação, por pressão de evangélicos e católicos, Marta Suplicy tenta colocar tema em pauta 18/05/2011 Semana passada o Brasil viu o adiamento da votação do PLC 122, graças às pressões de evangélicos e católicos. Mas Marta Suplicy garantiu que nesta semana, que marca o Dia Mundial de Combate à Homofobia (17 de maio), a votação ocorrerá, e os militantes gays já estão se reunindo em Brasília vindos de todo o Brasil para um grande ato pró-PLC 122 na frente da Catedral de Brasília. Há uma expectativa de que a senadora consiga levar o projeto para votação nesta quinta-feira (19). A pergunta a ser feita agora diante do rolo compressor gay é: O PLC 122 deve ser enfrentado de forma delicada, como apenas uma mera ameaça à liberdade de expressão e opinião? Ou deve ser encarado como um perigo maior?
Marcelo Crivella sugere texto alternativo ao PLC anti homofobia.

Senador apresentou texto à relatora do projeto, Marta Suplicy

19/05/2011 Na opinião de Crivella, o projeto atualmente em análise na Comissão de Direitos Humanos e Participação Legislativa (CDH), que já foi aprovado pela Câmara dos Deputados, impõe uma mordaça aos religiosos.
“O PLC 122/06 já naufragou porque quer dar direitos a uns destruindo o direito dos outros, afetando cláusulas pétreas da Constituição federal”.
Manifestação contra PLC 122 em Brasília. Deputado João Campos concede entrevista exclusiva ao CPAD News 01/06/2011 Acontece hoje em Brasília, Marcha da Família, uma iniciativa das principais lideranças evangélicas com o objetivo de esclarecer o público brasileiro sobre as consequências que poderão trazer às famílias caso o Projeto de Lei 122/06 seja aprovado no Senado.
Marcha para Jesus no Rio de Janeiro 03/06/2011 A ‘Marcha para Jesus’, evento gospel realizado amanhã pelas igrejas evangélicas do estado e organizado pelo Conselho de Ministros do Estado do Rio, deverá se transformar num megaprotesto contra o Projeto de Lei (PL) 122, que tramita no Senado e criminaliza qualquer ação ou fala interpretada como preconceito em relação ao homossexualismo.
Após oposição de evangélicos, PL 122 será alterado Projeto aprovado anteriormente na Câmara fere a Constituição brasileira quanto às liberdades religiosa e de expressão 27/06/2011  O projeto de lei que criminaliza a “homofobia” (PLC 122/06) deverá ser descartado para que uma nova proposta seja apresentada – pela bancada evangélica, segundo a senadora Marta Suplicy (PT). O trâmite, assim, volta à estaca zero. O projeto agora precisa tramitar por todas as comissões e voltar a ser votado na Câmara dos Deputados, onde já havia sido aprovado em 2006. 
Após PL 122 ser´engavetado`, é apresentado novo texto feito com evangélicos. Na nova proposta, discursos contra a homossexualidade não são condenados – esse era o maior impasse, já que fere a Constituição 11/07/2011 Nesta nova proposta, discursos que condenam a homossexualidade não entraram no texto – esse era o maior impasse, já que fere a Constituição brasileira quanto às liberdades religiosa e de expressão. O texto atual condena crimes homofóbicos violentos, discriminação no trabalho, em ambientes comerciais ou repartições públicas e violência doméstica.
Novo PLC 122 sobre homofobia ganha nome de ´Lei Alexandre Ivo` Senador evangélico reforça que não é certo priorizar as minorias de forma isolada 18/07/2011 Além de algumas alterações, o PLC 122, já tem novo nome: “Lei Alexandre Ivo”. Segundo a assessoria da senadora Marta Suplicy (PT-SP), o nome, a exemplo da Lei Maria da Penha, que tornou mais rigoroso o tratamento de crimes cometidos contra a mulher, é uma homenagem ao adolescente que foi assassinado “supostamente” por ser homossexual.
Milhares de evangélicos acompanham a votação da PL122. Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) poderá apoiar PL122 08/12/2011 Esta quinta-feira, dia 08, é decisiva a evangélicos de todo o Brasil. Milhares de pastores e líderes acompanharão pela TV, ou irão presenciar em Brasília (DF), a votação na Comissão de Direitos Humanos do Senado, o projeto que criminaliza a homofobia. A senadora Marta Suplicy tenta ganhar o apoio de parlamentares católicos e evangélicos ao propor que os cultos em lugares fechados fiquem “livres” da lei. Mas com um pouco mais de malícia é possível perceber as estratégias da senadora petista para aprovação do projeto perigoso às Igrejas. 
PL 122: temendo reprovação, senadora pede reexame e adia votação. Marta disse que vai tentar conseguir um acordo para retomar a tramitação da proposta 08/12/2011 Nesta quinta-feira, a senadora Marta Suplicy (PT-SP), em face do risco de perder a votação para aprovação do PLC 122 (que criminaliza a opinião contra a prática homossexual), pediu o reexame do projeto de lei da Câmara (PLC) nº 122/2006. Relatora do projeto, Marta disse que vai tentar conseguir um acordo para retomar a tramitação da proposta.
Pastor e deputado federal Ronaldo Fonseca fala durante Seminário LGBT em Brasília 16/05/2012 Durante o Seminário, o líder da Bancada da Assembleia de Deus na Câmara, deputado Ronaldo Fonseca (PR-DF), que também é pastor, lamentou o fato de os evangélicos serem considerados “o inimigo número um da causa LGBT”. Fonseca explicou “O evangélico não concorda com a prática homossexual, mas isso não significa homofobia. Ser evangélico é respeitar e promover a tolerância”. 
Projeto assegura liberdade de criticar homossexualismo. Líderes religiosos poderão ensinar a doutrina professada pela sua igreja quanto à sexualidade 23/01/2013 Victório Galli afirma que o objetivo da medida é assegurar o direito constitucional de livre manifestação do pensamento. O temor é de que o projeto de lei que criminaliza a homofobia (PLC 122/06, que tramita no Senado) possa vir a prejudicar o ensino religioso de que o homossexualismo é pecado. Segundo o autor, se o PLC for aprovado, o líder religioso que ensinar que o homossexualismo é pecado correrá o risco de ser preso.
Movimento LGBT tenta aprovar PL 122 em todo o País.

Parecer Jurídico da ANAJURE revela que movimento LGBT tenta aprovar leis estaduais

14/06/2013 Mesmo com toda oposição que o PL 122 vem sofrendo, ao longo dos anos, no Congresso Nacional, tendo em vista seu termos polêmicos e, para muitos, inconstitucionais, diversos estados brasileiros, nos últimos tempos, têm aprovado leis que sancionam a “homofobia”. Essas leis determinam penalidades administrativas a servidores públicos, entidades e até cidadãos, exatamente nos mesmos termos do PL 122 federal. 
Cristãos revoltados após pedofilia ser oficialmente aceita como “opção sexual” 31/10/2013  No Brasil, em meio ao debate do Projeto de lei PLC 122, proposto pelo PT, o senador Magno Malta, declarou: “Se aprovarmos um projeto desses, de você ser criminoso por não aceitar a opção sexual de alguém, é como se você estivesse legalizando a pedofilia, o sadomasoquismo, a bestialidade… O advogado do pedófilo vai dizer, senhor juiz a opção sexual do meu cliente é criança de nove anos de idade. O juiz vai decidir como, se está escrito que é crime?”
Mobilização hoje contra a aprovação do PLC 122. Se aprovado, o conceito de família natural será destruído na legislação brasileira 20/11/2013 Nesta quarta-feira (20) o Senado deve votar no Projeto de Lei Complementar 122/2006 (PLC), concebido para criminalizar a “homofobia”, conceito muitas vezes interpretado como qualquer opinião contrária às práticas homossexuais.
PLC 122: votação suspensa após pressão dos evangélicos 21/11/2013 O dia 20 de novembro (quarta-feira) foi um dia de derrotas para os militantes do supremacismo gay. A pressão sobre o PLC 122 foi tão grande que o senador Paulo Paim, autor de uma mudança no PLC 122 que supostamente deixava o projeto “inócuo,” teve de retirá-lo da pauta da votação.
Semana decisiva em Brasília Congresso Nacional deverá votar diversos projetos contrários a princípios cristãos 10/12/2013  O PLC 122/2006 é o polêmico projeto que, segundo ativistas gays, trata do combate à homofobia. Na visão dos líderes cristãos e parlamentares das bancadas evangélica e católica, o projeto é uma “mordaça gay”, pois interfere no direito ao livre pensamento e à liberdade de expressão, além de ser visto como inconstitucional por muitos justamente por estabelecer privilégios a cidadãos homossexuais.
PL122 é retirada de pauta da CDH pela terceira vez Sessão foi acompanhada por ativistas e entidades de defesa dos direitos dos homossexuais e de representantes de igrejas 13/12/2013 Mais uma vez, o relator da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participação, senador Paulo Paim (PT/RS) apresentou um texto substitutivo ao PLC 122/2006 e a votação foi adiada devido à apresentação de pedido de vista coletiva. Senador Magno Malta (PR/ES) reconhece que com a retirada da palavra homofobia houve avanço, mas é necessário fazer correção da terminologia gênero, identidade de gênero e orientação sexual.
PL 122 é anexado à reforma do Código Penal Projeto de lei que criminalizava homofobia foi apensado à proposta do novo Código Penal 19/12/2013 No dia 17/12/2013, um dos projetos de lei mais conhecidos no Brasil, o PLC 122, que visava criminalizar a homofobia, foi apensado à proposta do novo Código Penal (PLS 236/2012), no Senado Federal. Em regra, portanto, o PLC 122 não existe mais. Isso é uma grande vitória contra um projeto ideológico e ditatorial, que tinha como objetivo proibir a livre manifestação do pensamento e da crença religiosa ou filosófica.
Consciência Cristã se consolida em 2014 17/01/2014 Responsável pela organização do Encontro para a Consciência Cristã, a VINACC (Visão Nacional para a Consciência Cristã) realiza o evento todos os anos no período do feriado de Carnaval. Difunde ainda outros projetos de evangelização e campanhas a respeito de temas do interesse da família e da comunidade cristã, como no caso da que foi feita contra a aprovação da PLC 122/06.
Consciência Cristã: começa hoje um dos maiores eventos cristãos da América Latina Evento é fundamentado na difusão de conhecimentos e valores cristãos 27/02/2014  Evento pioneiro criado para a difusão de valores cristãos baseados na Bíblia, o Consciência Cristã se diferencia de outros acontecimentos do meio evangélico por se focar unicamente nas Escrituras como norma de fé e prática de vida. (…) Difunde ainda outros projetos de evangelização e campanhas a respeito de temas do interesse da família e da comunidade cristã, como no caso da que foi feita contra a aprovação da PLC 122/06.

 Fonte: http://www.cpadnews.com.br/home.html.

           Nesses excertos, percebe-se o acompanhamento ostensivo da mídia evangélica sobre a tramitação do PLC 122. As notícias revelam uma preocupação sobre a conquista dos direitos do segmento LGBT, o que representaria, segundo os evangélicos, o estabelecimento de limites para a liberdade religiosa, onde os fiéis seriam punidos caso manifestassem contrariedade a homossexualidade. São os valores religiosos e as representações que integram esses discursos, mesclando argumentos políticos e legais, que demonstram a complexidade das relações estabelecidas entre Religião e Estado.

           O espaço político é o das disputas entre diferentes atores sociais, mas que permite a entrada de argumentos religiosos, apesar de estes sofrerem mudanças em algumas circunstâncias. A oposição nós/eles muitas vezes é construída na política tendo como base categorias morais, por exemplo, o “bom” versus o “ruim”.

           Chantal Mouffe (2009) defende que os antagonismos no campo político são baseados por estas dicotomias, utilizando muitas vezes termos não políticos, como é característico no discurso evangélico. Dessa forma, este segmento poderá ser caracterizado como adversário, dentro de uma lógica agônica e não como inimigo, pois, não é perceptível a relação antagônica sobre os temas morais que são mobilizados e defendidos pelo grupo evangélico. Contudo, a política, conforme observa Mouffe (2006) busca estabelecer a unidade em um contexto de conflitos e diversidade de opiniões. A política democrática não pretende superar a oposição nós/eles, que é impossível, ela apenas quer mostrar como este tipo de antagonismo é compatível com a democracia. A partir do pluralismo agonístico, o propósito é garantir que os inimigos não sejam destruídos, mas sim combatidos enquanto adversários, cujas ideias os mesmos podem defender quando obedecem todas as regras do jogo democrático.

           Ainda com relação aos fragmentos citados acima, quando emergem temas relacionados à orientação sexual, assunto tratado com exaustão pelos evangélicos, surgem, consequentemente, os discursos baseados em dogmas confessionais favoráveis à rejeição desse assunto na esfera política. Isso justifica que a homossexualidade, assim como é diagnosticada nos discursos nos templos, deve ser encarada como “pecado” ou “doença”. Tanto o discurso evangélico identificado nos meios de comunicação, quanto o discurso proveniente de parlamentares evangélicos no plenário, constituem o que é chamado de comunidade discursiva (MAINGUENEAU, 1998). Assim, os evangélicos de modo geral, partilham de códigos de disciplina, de regras e valores responsáveis pela constituição de um mesmo tipo de enunciado, neste caso, o político, religioso e jornalístico estão ligados no mesmo processo de produção discursiva.

           Retornando aos pronunciamentos de parlamentares identificados nos diários oficiais, o discurso evangélico na Câmara sobre a homossexualidade não busca sustentar-se apenas em preceitos confessionais, visto que foi identificada em alguns pronunciamentos uma tendência em tornar “científico”, ou seja, de “laicizar” o conteúdo discursivo sobre o assunto (MACHADO; BURITY, 2014). Os fragmentos abaixo demonstram esta característica:

Ninguém nasce gay, não existem pesquisas em nenhum lugar do mundo que tenham conseguido comprovar evidência orgânica para a homossexualidade. Algumas pesquisas como a do hipotálamo e a dos gêmeos (ambas já descartadas por cientistas americanos; temos registros seguros do que afirmamos) chegam aos países do terceiro mundo como panacéia para o conflito interior que atinge gays e lésbicas, independentemente de sua condição social, cultural, econômica, religiosa ou familiar. O homossexualismo é um estado de vida completamente reversível (…). Dep. Pastor Francisco Olímpio, PSB – PE (Diário da Câmara dos Deputados, 06/07/2005, Sessão: 169.3.52.O / BC)

O que está por trás realmente desse projeto de lei de homofobia é a tentativa de impor a todos o dogma da moralidade ou naturalidade do homossexualismo, que não é científico, mas de origem ideológica, tornando-se penalmente punível a contestação a essa pretensa verdade. Dep. Jefferson Campos, PTB – SP (Diário da Câmara dos Deputados, 10/06/2008, Sessão: 132.2.53.O / BC)

           O acionamento de argumentos que são provenientes do campo científico é cada vez mais constante no discurso religioso evangélico, diferente do que era identificado nos primórdios da participação evangélica na política onde era perceptível uma postura mais sectária e proselitista diante dos temas que surgiam no legislativo. Christina Vital e Paulo Victor Leite Lopes, através de pesquisa realizada pelo Instituto de Estudos da Religião (ISER) intitulada Religião e Política no Brasil, entre setembro de 2011 e agosto de 2012, chegam a resultados que comprovam esta tendência. Em entrevistas feitas com integrantes da FPE, surgiram relatos sobre a necessidade de dar um caráter mais científico para a frente, “buscando se afastar do estigma que pesa sobre a religião no Parlamento e também da negatividade associada socialmente à imagem dos evangélicos, sobretudo pentecostais e neopentecostais” (VITAL DA CUNHA; LOPES, 2012, p.156).

           Atualmente os evangélicos, atentos ao crescimento e à necessidade de dar novos embasamentos às suas justificativas, mobilizam outros discursos provenientes de campos distintos ou de épocas diferentes, onde um discurso particular pode estabelecer uma relação interdiscursiva com unidades de dimensões bem variáveis e, neste caso, torna-se perceptível a relação do discurso religioso com o científico, a presença, por alusão ou citação, de um discurso em outro. Trata-se de discursos ligados por um conjunto de relações interdiscursivas. O funcionamento através de uma intertextualidade externa, mobilizada por discursos de campos distintos (MAINGUENEAU, 1998).

           Quando ocorre a mescla entre discursos provenientes de áreas diferentes, como no caso aqui investigado, o discurso religioso e o discurso científico, é possível identificar o conjunto das unidades discursivas que entram no processo de relação, aqui observado por recorrência das justificativas religiosas que consideram a homossexualidade ou enquanto ‘doença” ou “conduta moral” que está sendo imposta pelo segmento LGBT através de leis, constituindo assim duas formações discursivas. Isso tudo representa uma relação interdiscursiva, pois os pronunciamentos fazem uso da repetição e transformação de elementos do saber, responsáveis pelo deslocamento das fronteiras dessas formações discursivas (COURTINE, 2009). Dessa forma, é através de tal relação interdiscursiva, da relação que um discurso mantém com outros discursos, que é possível entender os procedimentos em que estes são submetidos, ou seja, à repetição, refutação e articulação de formações discursivas que podem também ser consideradas como formações ideológicas antagonistas, neste caso, entre defensores e apoiadores do PLC 122.

           Voltando aos excertos citados acima, o projeto de lei de homofobia mencionado pelo deputado Jefferson Campos é o PLC 122/2006. Campos é integrante da Igreja do Evangelho Quadrangular e também da FPE. O deputado argumenta que o projeto é inconstitucional, já que, segundo o mesmo, cercearia a liberdade de pensamento e de crença religiosa, o que é assegurado na Constituição, e que criaria uma lei que daria superdireitos aos homossexuais. Para aqueles que manifestassem qualquer opinião contraria aos direitos dos homossexuais, seriam impostas penalidades de até cinco anos de reclusão para qualquer tipo de manifestação, seja ela de ordem filosófica ou religiosa. Segundo Campos, isto representaria um verdadeiro atentado à liberdade de convicção religiosa, porque seria estabelecido um policiamento ideológico sobre as igrejas. Posicionamentos semelhantes também são identificados nos seguintes pronunciamentos:

           Alerto os Senadores para os problemas constitucionais que este PLC encerra. Primeiro, diz respeito às liberdades de expressão e de pensamento, o que fere frontalmente o art. 5º da Constituição Federal. Em uma sociedade democrática e republicana, não se pode pôr em risco o que asseguramos a duras penas: a liberdade de expressão e de pensamento. O movimento dos gays, lésbicas, bissexuais e transexuais tem defendido a necessidade da aprovação desse projeto de lei, porque ele criminaliza a homofobia. Mas nele há um problema: ao mesmo tempo em que dá liberdade a essas pessoas, retira a liberdade dos pastores e dos padres de serem contra ou de dizerem, baseados em sua fé, em seus princípios bíblicos, que a homossexualidade é um pecado. Na verdade, o PLC nº 122 se opõe à ética, à filosofia, ao juízo de valor. Dep. Henrique Afonso, PT – AC (Diário da Câmara dos Deputados, 24/05/2007, Sessão: 121.1.53.O / CP).

(…) quero fazer um apelo aos Senadores, especificamente aos membros da Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal, onde será votado o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 122, de 2006, que trata de homofobia, de discriminação, tema aparentemente justo e digno. Porém, nós entendemos que, do jeito que está, a proposta é inconstitucional, ilegítima. Dep. Bispo Rodovalho, DEM – DF (Diário da Câmara dos Deputados, 23/06/2008, Sessão: 150.2.53.O / GE).

           Em nossa avaliação, o projeto fere de forma inaceitável princípios básicos da Constituição Federal, pois entre suas consequências estaria a de criar embaraços e restrições à liberdade religiosa e de opinião. Não podemos aceitar que aqueles que por questões de princípios éticos, morais e institucionais tiverem posições contrárias a determinados comportamentos não possam expressar essas posições sob pena de serem criminalizados por isso. O projeto estabelece, por exemplo, como crime, no art. 16, § 5ª, a prática de qualquer tipo de ação “constrangedora, intimidatória ou vexatória, de ordem moral, ética, filosófica ou psicológica” contra o homossexualismo. Caso esse texto seja aprovado, fatalmente certos grupos organizados de interesse poderão usar de interpretações distorcidas para tentar criminalizar aqueles setores da sociedade que, por convicção religiosa ou moral, têm posições críticas em relação à prática do homossexualismo e a outras que, no nosso entender, ferem os princípios cristãos.  Não se trata de homofobia, nem discriminação, e sim de direito à crítica e à opinião. Dep. Andre Zacharow, PMDB – PR (Diário da Câmara dos Deputados, 08/06/2011, Sessão: 144.1.54.O / PE).

       Todos os pronunciamentos supracitados qualificam o PLC 122 como inconstitucional, visto que, na caracterização dos membros da FPE, este seria um atentado à liberdade religiosa. Apoiados na questão da liberdade de expressão, não só os evangélicos têm esta percepção negativa sobre o projeto, como demonstra o pronunciamento do deputado católico Miguel Martini (PHS-MG):

           Quero também, neste momento, alertar inclusive os nobres Senadores para o PL nº 122, de 2006, que, numa manobra regimental, discrimina todos os que não são homossexuais. Quem não é homossexual está discriminado por esse projeto. Então, por uma manobra regimental, extrapauta, por uma distração de alguns dos nossos Senadores, o projeto avançou em uma Comissão. Mas sem dúvida alguma estaremos agora ainda mais vigilantes para que ele não vá à frente, porque declaro aqui que nós respeitamos profundamente todo homossexual, e ninguém neste País pode ser discriminado, nem os que o são, nem os que não o são; cada um que se comporte de acordo com a sua escolha, com a sua opção, mas não venha impor aos outros a obrigação de pensar de forma igual. Dep. Miguel Martini, PHS – MG (Diário da Câmara dos Deputados, 12/11/2009, Sessão: 314.3.53.O / GE).

           Miguel Martini é membro de um grupo carismático de evangelização da Igreja Católica em Minas Gerais, atuando em movimentos e pastorais. O conteúdo de seu discurso é semelhante ao posicionamento da FPE e de outros parlamentares que atuaram na oposição ao PLC 122.  Diversos deputados, religiosos ou não, caracterizavam o PLC 122 como a “lei da mordaça”, visto que o projeto, principalmente através do seu artigo 20, estabeleceria a punição para qualquer tipo de ato que “induzisse, praticasse ou incitasse a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, sexo, orientação sexual e identidade de gênero”. O discurso que caracterizava a aceitação da homossexualidade como o início da destruição dos “bons costumes” e da “família brasileira” era o elemento aglutinador de evangélicos ou não evangélicos, um momento marcado pelo ressurgimento de argumentos morais. Trata-se de um ato discursivo perlocutório (RICOEUR, 2013), visto que ao dizerem que a aceitação dessa lei traria riscos a um conjunto de valores religiosos, o efeito produzido seria a ênfase em discursos cada vez mais moralizantes, com o objetivo de persuadir o público ouvinte.

           Obviamente que os discursos que surgem no plenário da Câmara também se utilizam de elementos que são mobilizados nos púlpitos das igrejas evangélicas, e o lugar da fala ocupado pelo enunciador terá impacto no conteúdo discursivo, seja ele no púlpito ou no plenário. Em virtude de os diferentes públicos receberem o enunciado, poderá haver convergência em torno dos sentidos produzidos no ato discursivo, ao mesmo tempo em que é identificado o recurso de uma multiplicidade de linhas de retórica utilizadas na formulação do discurso, com o uso de palavras diferentes, mas que possuem o mesmo sentido, dependendo do contexto social-histórico em que são mencionadas. Contudo, cabe ao analista entender a utilização desses termos, como eles são ditos em um espaço específico e não ditos em outro, verificar também o modo em que eles são ditos, sempre procurando entender não o sentido explicito, mas o real sentido identificado na sua materialidade linguística e histórica (ORLANDI, 2013), ou seja, a materialidade da ideologia constituída em discurso no ato de dar significado, entendendo que os componentes sócio-históricos constituem a prática discursiva.

           De acordo com as informações obtidas através da leitura de sites de notícias, jornais e revistas provenientes de igrejas evangélicas[10], assim como os discursos identificados nas sessões legislativas na Câmara, é possível perceber a ocorrência de um continuum acerca do posicionamento dos evangélicos sobre o PLC 122. Diante do que é discutido na Câmara, pouco difere a argumentação utilizada nos sites e jornais evangélicos, com exceção da Igreja Universal que apresenta um discurso mais caracterizado pela conciliação, e menos de crítica sobre a tramitação do PLC 122. Contudo, as igrejas pentecostais, principalmente a Igreja Assembleia de Deus, demonstram um posicionamento incisivo sobre os projetos de lei que mencionam questões direcionadas à orientação sexual, homossexualidade ou homofobia, suscitando situações de embate diante dos temas. Por representarem canais diretos de comunicação com os seus fiéis, os jornais e sites evangélicos utilizam-se destes espaços para convocar o segmento religioso na tentativa de barrar leis que tratam destes assuntos e de justificar que é este o posicionamento da maioria do povo brasileiro, ou seja, a contrariedade sobre leis que almejam garantir a proteção dos direitos aos homossexuais.

           Se existem diferenças entre os discursos provenientes dos espaços jornalísticos religiosos com os espaços políticos, estas devem ser entendidas por meio de sua terminologia e não de conteúdo. Os diferentes contextos em que são mencionados estes discursos devem ser compreendidos através das representações que os participantes fazem para si (MAINGUENEAU, 1998). Porém, os discursos podem mudar o seu status ou gênero, dependendo dos contextos em que eles circulam. 

Os discursos favoráveis ao PLC 122/2006

           No polo oposto ao posicionamento dos parlamentares evangélicos na Câmara, estavam aqueles que manifestavam apoio ao PLC 122, muitos baseados no lobby que buscava construir mecanismos de combate à homofobia ou qualquer tipo de discriminação sofrida pelo segmento LGBT. Foram diversos os debates entre defensores e opositores do projeto, onde sempre entrava em cena a discussão sobre o papel do Estado laico e a influência de dogmas religiosos e tradicionalistas na política. Entre os defensores do projeto que pretendia criminalizar a homofobia, conforme o pronunciamento a seguir, estava a deputada federal Cida Diogo (PT-RJ):

           Esta Casa já aprovou o PLC nº 122, que se encontra no momento no Senado Federal. Tal projeto criminaliza a homofobia neste País. Foi esse o norte da Parada: Criminalização Já! Que seja crime a atitude homofóbica de qualquer pessoa que se ache no direito de perseguir, agredir e, muitas vezes, até de assassinar outra pessoa somente por esta ter assumido sua sexualidade, sem incomodar a ninguém. Há gente no Brasil que se acha no direito de perseguir pessoas de distinta orientação sexual. O PLC nº 122, cuja Relatora é a Senadora Fátima Cleide, tem de ser aprovado, para que possamos avançar no que se refere a direitos individuais na democracia e na liberdade sexual. Dep. Cida Diogo, PT – RJ (Diário da Câmara dos Deputados, 16/10/2007, Sessão: 286.1.53.O / PE).

           Cida Diogo vinha atuando na defesa do segmento LGBT no legislativo desde o seu mandato de deputada estadual no Rio de Janeiro. Na Câmara dos Deputados, foi escolhida por parlamentares e por diversas organizações não-governamentais para ser a Presidente da Frente Parlamentar pela Cidadania GLBT[11], organismo que atua na defesa dos direitos de gays, lésbicas, travestis, transexuais, transgêneros e bissexuais realizando eventos que discutem esta temática e também na execução e promoção de leis e políticas públicas.

           Os pronunciamentos a seguir também evidenciam o posicionamento favorável de uma parcela dos deputados no Congresso ao PLC 122:

A Constituição brasileira proclama que o Brasil é um Estado laico e que se opõe a toda e qualquer forma de discriminação. (…) Em consonância com o avanço da cidadania, o Brasil deve incorporar os direitos de milhões e milhões de pessoas que hoje são discriminadas somente em virtude de sua orientação sexual ou identidade de gênero. (…) O primeiro passo para resgatar a dívida do Estado e da sociedade com os GLBTs é a aprovação do PLC nº 122/2006, que criminaliza a homofobia. O projeto, atualmente na Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal, pune, com penas de 3 a 5 anos, os atos de discriminação praticados contra gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais. Dep. Iran Barbosa, PT – SE (Diário da Câmara dos Deputados, 28/06/2007, Sessão: 166.1.53.O / PE ).

(…) o movimento LGBT pede urgência na aprovação do PLC 122/2006, de autoria da Deputada Iara Bernardi e que agora tramita no Senado. Esse projeto criminaliza a homofobia. (…) Sabemos da resistência das bancadas evangélica e católica a esse projeto. Mas quando é que o Brasil entenderá que discursos homofóbicos incentivam a violência? O Estado brasileiro é laico, e é para garantir a liberdade e a democracia que tanto pregamos que o Parlamento brasileiro não pode mais silenciar e se manter omisso diante de tamanho preconceito, que pretende se esconder por trás de uma suposta liberdade de expressão para seguir violando direitos fundamentais. Dep. Ivan valente, PSOL – SP (Diário da Câmara dos Deputados, 23/11/2010, Sessão: 201.4.53.O / PE).

O projeto que criminaliza a homofobia coloca uma situação curiosa para o Estado brasileiro. Faz com que duas liberdades sejam colocadas em confronto. É preciso decidir de qual delas faz mais sentido abrir mão. Na maior parte, o projeto não tem qualquer motivo para contestação. A proposta proíbe, por exemplo, que alguém seja demitido por ser gay. Ou que alguém tenha qualquer direito negado por ser homossexual. (…) O ponto a ser discutido, porém, é outro. É sobre a incitação à homofobia. Aqui é que os evangélicos, que conseguiram evitar a discussão e a votação no Congresso nesta semana, reclamam. Na verdade, não são apenas eles (…). Os evangélicos dizem que o projeto coloca em risco a liberdade de expressão e a própria liberdade religiosa deles. Pela crença que têm, a homossexualidade é condenável, e querem poder dizer isso em seu culto, ou mesmo fora dele. Os homossexuais, por outro lado, querem ter o direito de viver como qualquer pessoa, com os mesmos direitos e sem riscos de serem hostilizados por isso. O projeto na sua versão atual até minimiza o problema ao dizer que religiosos podem defender dogmas e crenças desde que não incitem a violência contra os gays.Mesmo assim, pastores continuam acreditando que têm seus direitos cerceados. Dep. Amauri Teixeira, PT – BA (Diário da Câmara dos Deputados, 18/05/2011, Sessão: 116.1.54.O / OD).

           A argumentação utilizada pelos parlamentares citados acima demonstra que a maior preocupação é a de manter o caráter laico do Estado, cabendo a ele assegurar os direitos do público LGBT e atuar no combate de qualquer manifestação que seja enquadrada como homofóbica.  Iran Barbosa (PT-SE) afirma que o Estado brasileiro e a sociedade em geral têm uma dívida com os homossexuais, que seria sanada com a aprovação do PLC 122. Ivan Valente (PSOL-SP) destacou a forte oposição que estava sendo realizada pelos deputados religiosos ao PLC 122, representando neste período o maior entrave para a aprovação do referido projeto.  O pronunciamento do deputado Amauri Teixeira (PT-BA) sintetiza muito bem o que está sendo exposto por este artigo e qual é o seu propósito. Teixeira argumenta que a questão da liberdade está sendo disputada pelos religiosos e pelos defensores dos direitos dos homossexuais, ou seja, existe um conflito em torno do monopólio da palavra, o que representaria um fato curioso, pois ambos os lados reivindicam a liberdade. Delimita-se, reciprocamente, uma concorrência de duas formações discursivas distintas dentro de um mesmo campo dotado de regras, onde os enunciadores buscam demarcar suas diferentes posições e que também se distinguem segundo as diversas formas em que organizam os seus discursos. Com este cenário de tensão entre duas concepções sobre a ideia de liberdade, surge um campo de disputa em torno do real significado da palavra preconceito e discriminação, ocasionando, assim, o conflito entre duas formas de direitos – o da livre expressão religiosa e o da liberdade de orientação sexual. O resultado desta tensão é o consenso entre as lideranças religiosas no que diz respeito ao combate à criminalização da homofobia (MACHADO, 2010).

           Seguindo a contribuição de Orlandi (2013), pode-se afirmar que palavras iguais possuem significados diferentes, porque se inscrevem em formações discursivas diferentes, neste caso entre apoiadores e críticos ao Projeto de Lei, as palavras “liberdade”, “família” e “preconceito” apresentam finalidades diferentes na formulação dos enunciados. Sobre a utilização destas palavras, é possível perceber a disputa em torno dos significados de determinados termos utilizados por deputados contrários ao PLC 122 e os defensores.

           Courtine (2009) defende que o discurso político na sua concretude remete a uma determinada posição na luta ideológica de classes. Nos discursos na Câmara sobre o PLC 122 ocorre, dentro do mesmo espaço discursivo, a disputa pelo significado das palavras “liberdade”, “família” e “preconceito”, e esta disputa é responsável pela circulação do tema dentro de novas conjunturas que regulam o processo da construção de sentido, estabelecendo limites, naturalizando e promovendo alguns aspectos e criticando outros como, por exemplo, no momento em que os evangélicos questionam a liberdade de orientação sexual como entrave para a liberdade religiosa, compreendendo que uma acaba excluindo a outra.

           A tramitação do PLC 122/2006 representou um período de grande efervescência social, onde foram travados debates políticos em torno da lei que tem como objetivo a criminalização de atitudes preconceituosas, como a homofobia. Maria das Dores Machado, em pesquisa realizada neste período sobre a questão da homofobia como tema da agenda política do segmento LGBT, considera que o assunto ficou polarizado na seguinte forma:

(…) de um lado, os movimentos sociais, que tinham como principal demanda o mesmo tratamento dado aos crimes de racismo para o preconceito e a discriminação às pessoas com orientação sexual homossexual e, de outro, as diversas tradições religiosas, tomadas e assumidas como opositoras à lei, visto que percebiam como violados seus direitos à livre expressão. (MACHADO, 2010, p.115)

           Segundo Machado, os discursos de muitas instituições cristãs caracterizam as práticas homoafetivas como tipos de comportamentos transgressores à lei da natureza ou lei de Deus, que, na concepção religiosa, teria criado apenas dois seres com sexos distintos para realizar a procriação e se complementarem. Neste caso, “(…) a homossexualidade e os indivíduos que a praticam são percebidos como ameaças às ordens social, política, moral e, em alguns casos, legal das sociedades” (MACHADO, 2010, p.117). De acordo com as diferentes caracterizações que o PLC 122 demonstra na Câmara, percebe-se uma disputa em torno dos sentidos em que os significados do termo liberdade e preconceito recebem, pois ambos os lados, evangélicos e movimentos LGBT se declaram como vítimas do preconceito e também como minorias perseguidas.

           Através deste trabalho de análise e apresentação dos pronunciamentos provenientes de parlamentares evangélicos e não evangélicos mobilizados na Câmara sobre o PLC 122 é possível fazer uma primeira tentativa de classificação deste tipo de discurso confessional, seguindo a tipologia apresentada por Orlandi (2013), tendo como base os diferentes modos de funcionamento dos enunciados, tomando como referência os elementos constitutivos de suas condições de produção e sua relação com os efeitos decorrentes. O discurso evangélico na Câmara pode ser considerado um tipo de discurso polêmico, onde a polissemia é controlada, o referente é disputado pelos interlocutores, sendo que estes se mantêm em presença, situados em uma relação tensa de disputa pelos sentidos (ORLANDI, 2013).

           Outra característica do discurso evangélico sobre o PLC 122 é a mobilização de diferentes posições no momento em que o enunciador procura transmitir o sentido do seu posicionamento acerca do tema, em outras palavras, a variedade que a palavra “nós” adquire dentro do discurso religioso. Em diversos contextos os parlamentares se apresentavam não apenas como “nós, religiosos”, mas sim como “nós, defensores da família”, “nós, brasileiros” e “nós, defensores da Constituição”. Cada “nós”, construído dentro de um contexto de diversidade e conflito (MOUFFE, 1999), passa a constituir um sentido capaz de se articular dentro do discurso de contrariedade ao PLC 122, e, cada sentido é capaz de dialogar com diferentes setores, religiosos ou simplesmente conservadores. Isto quer dizer que o discurso evangélico é capaz de romper as barreiras do discurso puramente confessional e proselitista para se manter na política. Dessa forma, conforme sugere Mouffe (1999), dependendo do contexto em que é mencionado e da posição do sujeito enunciador, a principal característica deste discurso poderá ser a pluralidade de posições, assim, o pluralismo, a multiplicidade e o conflito, verificados aqui nos enunciados religiosos, passam a ser elementos constituintes da política. 

Considerações finais

           Os evangélicos representam atualmente um segmento em expansão no cenário político brasileiro. Trata-se de um grupo que não é homogêneo, mas que possui a capacidade de revelar o quanto alguns temas que são caros ao discurso religioso, ainda detêm um potencial aglutinador de evangélicos e não evangélicos no espaço legislativo, no caso explorado neste texto, a atuação evangélica sobre o PLC 122.

           As relações entre política e religião continuam complexas. Quando são discutidos determinados temas, diferentes vocabulários, religiosos ou laicos, entram em concorrência, ou até mesmo se entrecruzam. Os pronunciamentos sobre o PLC 122 revelam que os discursos evangélicos constituem-se em híbridos de justificativas que mesclam argumentos religiosos ou seculares em uma contínua tensão, visto que, ao mesmo tempo em que os evangélicos lançam os seus exemplos bíblicos, como o caso de Sodoma e Gomorra para justificar o posicionamento sobre a homossexualidade, é perceptível a utilização de discursos que se intitulam “científicos”, na tentativa de laicizar a atuação política destes atores religiosos. Acompanhando as circunstâncias em que o tema foi mencionado, desde o primeiro pronunciamento na Câmara, é possível identificar as mudanças ocorridas nos argumentos utilizados. No primeiro momento, a partir de 2003, os evangélicos concentravam sua contrariedade baseados em preceitos bíblicos, com uma postura confessional dogmática, já no segundo momento, em 2005, buscavam justificativas em argumentos caracterizados como “científicos”, e por fim, a partir de 2011, sustentavam a contrariedade, baseados em preceitos legais, tendo a Constituição Federal como elemento de apoio.

           Deve-se destacar que a maioria dos discursos contrários ao PLC 122 é proveniente de parlamentares vinculados à Assembleia de Deus, e isto também foi verificado nos meios de comunicação que subsidiaram a análise, visto que grande parte das notícias relacionadas ao tema foi identificada nos jornais e sites da denominação pentecostal clássica. Os diferentes lugares do discurso, ou campos discursivos, investigados na pesquisa, evidenciam as múltiplas características que o sentido do enunciado adquire, seja ele proferido no púlpito da igreja ou no plenário da Câmara. Contudo, o significado do discurso será moldado através da forma como ele é recebido e identificado pelo público. A análise discursiva é pertinente para este tipo de investigação, pois ela não procura apenas a simples interpretação, não está atrás de um sentido verdadeiro, pela simples razão de que não existe uma verdade oculta atrás do texto. É preciso entender os gestos de interpretação, como os diversos verificados no discurso evangélico, e como estes acabam se constituindo. Os discursos não estão prontos e acabados. Eles estão sempre se fazendo. Havendo um trabalho contínuo, um movimento constante do aparato simbólico e da história. (ORLANDI, 2013). Dessa forma, o discurso evangélico sobre o PLC 122 não representa um discurso verdadeiro, ele está inserido nas disputas, adquirindo diferentes sentidos que podem variar, dependendo do campo discursivo em que é mencionado.

           Os evangélicos afirmam que estão sendo apoiados por uma maioria brasileira que é religiosa que, na opinião destes, seria contraria ao PLC 122. O ato de buscar o apoio na população para criticar qualquer tentativa de ampliação de direitos para os homossexuais trata-se de uma estratégia comum, utilizada não apenas quando é mencionado este tema, mas outros assuntos como o aborto e as pesquisas com células-tronco embrionárias. 

           A tramitação do PLC 122 na Câmara e no Senado serve como exemplo de assunto capaz de revelar os diferentes posicionamentos polêmicos em torno do tema da homossexualidade, os preconceitos gerados por alguns segmentos religiosos, assim como a crescente presença pública da religião, a pluralidade de atores e de práticas, e as diferentes estratégias utilizadas pelos evangélicos na tentativa de impor os seus valores e dogmas a um Estado laico.

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Notas:

[1] O presente texto é uma versão adaptada de parte da minha tese de doutorado, intitulada O discurso religioso na política e a política no discurso religioso: uma análise da atuação da Frente Parlamentar Evangélica na Câmara dos Deputados (2003-2014), defendida junto ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, em junho de 2016.

[2] Professor da Universidade Federal do Pampa. E-mail:rafaelbruno1980@gmail.com.

[3] O Projeto “Altera a Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor, dá nova redação ao § 3º do art. 140 do Decreto-Lei n° 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e ao art. 5° da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei n° 5.452, de 1° de Maio de 1943, e dá outras providências (PL n° 5.003/2001, Câmara dos Deputados).

[4] Suplente do Senador evangélico Marcelo Crivella (PRB-RJ). Eduardo Lopes, que também faz parte da Igreja Universal do Reino De Deus, foi afastado do cargo em 14/03/2014 para o retorno do titular. Fonte: Senado Federal.

[5] Fase em que foi realizada a coleta de pronunciamentos de deputados evangélicos nos Diários Oficiais da Câmara.

[6] Maria das Dores Machado explica que foi na década de 1990, com a revisão do Código Internacional de Doenças (CID-10), que o ““homossexualismo” deixou os códigos que definiam as doenças de ordem psiquiátrica e/ou psicológica, tornando-se violação dos direitos humanos o diagnóstico e o atendimento psicológico a pessoas que quisessem deixar a homossexualidade. A partir de então, o sufixo “ismo”, que significa “doença”, foi substituído pelo “dade”, que faz referência ao modo de ser de cada indivíduo” (MACHADO, 2010, p.113).

[7] Trata-se de uma categoria desenvolvida por Ernesto Laclau para compreender o estímulo da prática discursiva através de um ponto capaz de articular as mais diversas demandas diante de uma fronteira antagônica instável. O ponto nodal, ou aquele momento do discurso que é capaz de aglutinar, é proveniente da psicanálise lacaniana. Laclau parte desta referência e chama de pontos nodais aqueles pontos discursivos privilegiados dentro de uma fixação parcial de sentido, mesmo que estes apresentem ainda todo um caráter de contingência e precariedade (LACLAU & MOUFFE, 1987). Estes pontos discursivos resultam de um momento de oposição a algo que é percebido como inimigo, ou seja, aquilo que de fato representa uma ameaça, situação na qual surge uma relação antagônica.

[8]  Sobre este tema, a partir da criação da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad/MEC), em 2004, surgiu o programa de combate à violência e à discriminação contra LGBT’s e de promoção da cidadania homossexual Brasil sem Homofobia, resultado de parceria entre o governo federal e a sociedade civil, organizada pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Este programa prevê ações nas áreas da saúde, segurança, trabalho, educação e cidadania. O Programa Brasil sem Homofobia trata-se de uma campanha promovida pelo Ministério da Educação em parceria com outras instituições, que pretende distribuir materiais didáticos nas escolas com a proposta de combater o preconceito contra homossexuais e fornecendo subsídios para os profissionais na educação trabalharem com o tema nas salas de aula. Tal proposta tem sido alvo de questionamentos e polêmicas. Diversas manifestações contrárias ganharam corpo, principalmente aquelas provenientes de segmentos religiosos.

[9] De acordo com a Bíblia, as razões da destruição das cidades de Sodoma e Gomorra foram a perversidade dos moradores e a imoralidade e desobediência aos preceitos religiosos. Conforme menciona o livro de Gênesis, dois anjos foram enviados por Deus para destruir as cidades. “E vieram os dois anjos a Sodoma à tarde, e estava Ló assentado à porta de Sodoma; e vendo-os Ló, levantou-se ao seu encontro e inclinou-se com o rosto à terra; Gênesis 19:1. E antes que se deitassem, cercaram a casa, os homens daquela cidade, os homens de Sodoma, desde o moço até ao velho; todo o povo de todos os bairros. E chamaram a Ló, e disseram-lhe: Onde estão os homens que a ti vieram nesta noite? Traze-os fora a nós, para que os conheçamos. Gênesis 19:4-5 E ao amanhecer os anjos apertaram com Ló, dizendo: Levanta-te, toma tua mulher e tuas duas filhas que aqui estão, para que não pereças na injustiça desta cidade. Gênesis 19:15 Então o Senhor fez chover enxofre e fogo, do Senhor desde os céus, sobre Sodoma e Gomorra; E destruiu aquelas cidades e toda aquela campina, e todos os moradores daquelas cidades, e o que nascia da terra. Gênesis 19:24-25”.

[10] Foi realizada a coleta de notícias sobre o PLC 122 nos seguintes meios de comunicação evangélicos: Notícias Gospel Mais; Jornal Folha Universal; Jornal Mensageiro da Paz (Assembleia de Deus); Revista Aliança (Assembleia de Deus Vitória em Cristo); Casa Publicadora das Assembleias de Deus (CPAD News); Igospel (Igreja Renascer), Portal Universal.org; Portal Igreja Quadrangular.

[11] Durante a 1ª Conferência Nacional GLBT realizada em Brasília em 2008, a deputada Cida Diogo (PT-RJ) decidiu passar a coordenação da Frente Parlamentar pela Cidadania GLBT para a senadora Fátima Cleide (PT-RO), que já vinha conduzindo os trabalhos na qualidade de relatora do PLC 122/2006. Consta nos anais da 2ª Conferência Nacional de Políticas Públicas e Direitos Humanos de LGBT, realizada em 2011 em Brasília, através do depoimento de Julian Rodrigues, membro da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Travestis e Transexuais – ABGLT, a informação de que Cida Diogo enfrentou dificuldades durante a segunda legislatura da frente, em 2007. O resultado destas dificuldades foi identificado nas eleições de 2008, quando Cida Diogo foi duramente criticada por ter sido coordenadora da frente parlamentar GLBT, assumindo que depois da campanha, não teria mais condições políticas e eleitorais para conduzir e protagonizar os trabalhos da frente. Disponível em: Anais da 2ª Conferência Nacional de Políticas Públicas e Direitos Humanos para Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – LGBT.

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